Nem sempre corre totalmente
bem.
Como fui passar o
fim-de-semana a terras de Marvão, mais exatamente no fantástico Monte de S.Sebastião, levei a bicicleta para tentar repetir o trilho Beirã-Areias que
tinha já feito uma vez. Houve uma pequena parte do caminho que da outra vez
tinha atalhado por pressões de tempo e porque não me pareceu lá muito
interessante. Desta vez resolvi conhece-lo. E ainda bem, porque acabou por ser
das partes mais giras da rota. Rápida, exigente e com uma descidas em pedra
equivalentes a 10mg de adrenalina diretamente numa veia. Só que…
Com a temperatura a
rondar os 28º e sem andar de bicicleta desde há tempo demais, as minhas pernas
ressentiram-se e a uns 6 Km’s do final comecei a ter cãibras constantes. Lá
parava um pouco, alongava e a coisa melhorava. Mas o trilho é exigente, com
caminhos muito irregulares de pedra um pouco a subir e rapidamente tinha de
parar de novo.
A apenas 2 Km’s do final,
já numa estrada, linda por sinal, desisti e resolvi continuar a pé. Mas nem
assim. O femoral não perdoava e nem caminhar conseguia. Nunca tal me tinha
acontecido. Estava prestes a pegar no telemóvel, que agora nunca fica sem
bateria nem com os programas de navegação todos ligados, graças a uma bateria
externa USB que agora uso e eis que saído de um caminho, entra na estrada um
lavrador com uma Pick-Up de cor indefinida e aspecto de muito trabalho.
Faço-lhe paragem e peço boleia.
Num Alentejo já profundo,
algo fora do habitual é bem-vindo para quebrar a monotonia do dia a dia. Ficou
ele tão contente como eu. Atirei a bicicleta para a caixa aberta da carrinha e
instalei-me na cabina onde ele se preocupava em tirar a terra do banco em que
ninguém se devia sentar há muito.
Vou trabalhando a terra, que sou sozinho e o que é
que hei-de fazer? Nunca falo com ninguém e por isso hoje nem trouxe os dentes,
explicava-me com um sorriso desdentado e sincero.
Por ele até me levava a
casa, mas lá lhe expliquei que tinha o carro na estação.
Triste ver pessoas boas
tão sozinhas.
A meio do trilho tinha passado por Santo António das Areias, onde na Praça de Touros, sim, mesmo no edifício
da Praça de Touros, debaixo da bancada, vive a Dna Maria Teresa.
Já tinha conversado com
ela uma vez ou duas. Tem a entrada repleta de plantas e flores, que se percebe serem o seu
orgulho. Parei à porta e chamei. Logo apareceu, com um sorriso tão sincero como
o do meu motorista desdentado. Lembra-se de mim, pergunto?
Claro, já cá esteve a
tirar fotos às minhas flores e outra vez de bicicleta!
Boa memória, ou pouca
gente de fora. Ou as duas coisas.
E posso desta vez
tirar-lhe uma foto com a minha bicicleta?
Diz que sim com uma
alegria que me contagiou.
Fotos tiradas,
agradeço-lhe e ia-me embora.
Olhe, queria pedir-me uma
coisa!
Pode por favor pôr esta
foto no Facebook?
Fiquei abismado. Aquela
senhora já avançada na idade, que mora debaixo de uma bancada numa praça de
touros de uma terra minúscula do Alentejo profundo sabe o que é o Facebook!
É que é para os meus
netos verem!
Claro que sim. Não se
preocupe. Despedi-me e continuei.
E agora? Como vou arranjar
maneira dos netos verem a fotografia da avó à porta de sua casa, ladeada pelas
suas plantas e a segurar uma bicicleta de montanha?
Não sei, mas arranjarei
maneira
Para já escrevo isto,
pode ser até, que alguém que se tenha dado ao trabalho de ler até aqui, conheça os netos. Agora vou imprimir a foto e enviar por correio para a Dona
Maria Teresa.
Foi uma tarde gira.
Excelente relato...
ResponderEliminarMas confessa, tu andas a partilhar a foto mas é para ver se encontras a velhinha que te roubou a bicicleta :-P
Conseguiu levar um pouco de alegria à solidão... Bem haja...
ResponderEliminarTalvez também um pouco isso
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